sexta-feira, 27 de março de 2009

Manuel Bandeira

Madrigal Melancólico

O que eu adoro em ti,
Não é a tua beleza.
A beleza é em nós que existe.
A beleza é um conceito.
E a beleza é triste.
Não é triste em si,
Mas pelo que há nela de fragilidade e incerteza

O que eu adoro em ti,
Não é a tua inteligência,
Não é o teu espírito sutil,
Tão ágil e tão luminoso,
- Ave solta no céu matinal da montanha.
Nem é a tua ciência
Do coração dos homens e das coisas.

O que eu adoro em ti,
Não é a tua graça musical,
Sucessiva e renovada a cada momento,
Graça aérea como o teu próprio momento,
Graça que perturba e que satisfaz.

O que eu adoro em ti,
Não é a mãe que já perdi.
Não é a irmã que já perdi.
E nem meu pai.

O que eu adoro em tua natureza,
Não é o profundo instinto matinal
Em teu flanco aberto como uma ferida.
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.
O que adoro em ti lastima-me e consola-me:
O que eu adoro em ti, é a vida!

Manuel Bandeira
In: "O ritmo dissoluto"

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